MEIO DEVOTO

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Passou anos frequentando o terreiro. Tornou-se cambono, hoje em dia toma conta das luzes durante a sessão, conhece cada passo de todos os rituais, sabe o nome de todos os médiuns, mas não consegue ser feliz.
Sua vida não vai para frente, seus afetos nunca permanecem, parece que nunca vai realizar-se.

Senta-se junto ao preto velho, que pacientemente o defuma mais uma vez. O umbandista dá um grande suspiro, espera meio impaciente o vovô soprar a fumaça de seu cachimbo sobre seu plexo solar, no esplênico, no laríngeo...Está tão absorto em seus problemas que perde a plenitude do momento de descarrego.

Logo começa a desfiar seu rosário de lamentações: "Assim não é possível, vovô. Tantos anos dedicados à esta casa, e eu não consigo nada do que almejo. Não consigo passar no concurso que eu precisava, em casa é só cobrança e a eleita do meu coração está me evitando...Eu quero ser feliz ! Nem dá vontade de voltar aqui, porque tantos anos pedindo aos orixás, e nada consigo, não acho justo!”

“Filho meu, dá um abraço cá no velho, e não amofine seu coração. Não adianta velho falar nada agora, que filho não vai entender. Mas siga em Paz e acredite que tudo pode melhorar.”

O cambono se despede e segue seu caminho cabisbaixo, não tendo aproveitado as qualidades dos fluidos que amorosamente recebeu. Ao chegar à sua casa, toma seu banho com os pensamentos no trabalho e nas tarefas cotidianas, já distanciando-se das questões do espírito. Dorme, sem nem mesmo uma prece, ressentido porque mais uma vez a amada não lhe atendeu a chamada telefônica tardia, esquecido que o celular do outro lado pode estar indisponível, ou a pessoa em questão dormindo, cansada das lutas diárias.

Mesmo assim, despreparado e já assediado por criaturas atraídas por seus pensamentos em desequilíbrio, vem chegando devagar o preto velho que lhe assistira horas antes. A gira já terminou faz tempo, mas a falange dos pretos velhos segue noite adentro, auxiliando aqueles que lhes rogaram benesses.

A entidade carinhosamente ajuda o rapaz a desprender-se de seu envoltório carnal, ainda preso pelo fio de prata que acompanha as viagens astrais dos vivos durante sua emancipação no sono, e o leva para um lindo vale repleto de flores sob a claridade solar, borboletas multicoloridas, pássaros canoros e animais brincando em alegre correria. Aos poucos, o rapaz vai conseguindo se sintonizar com a beleza do lugar e com as vibrações benfazejas. O preto velho o encara com seu bondoso olhar, e diz:” Agora suncê vai conseguir me escutar um pouquinho. Filho, tudo que está debaixo do céu é de conhecimento do Pai. Ele nunca esquece o menor de seus filhos. Mas nem sempre o que filho quer é o melhor para ele naquele momento. Suncê teima em achar que tudo tem que ser prá ontem, segundo sua vontade. Assim foi quando pediu aquele emprego em outro estado, mas hoje nem lembra mais. Ou quando queria um carro novo e já ouvi suncê falar há pouco que tal carro tem um monte de defeito. Quer porque quer a moça que até está fugindo de ocê, me jura que se não for ela não poderá ser mais ninguém, mas há poucos meses era outra moça, e sonhava até reencanar para encontrar ela de novo em outras circunstâncias. Pensa direitinho, firma sua cabeça. Suncê a cada hora tem um querer, não há preto velho ou qualquer entidade que vai acreditar na força de seu coração. Além de tudo, suncê deu para ameaçar largar a religião caso não for atendido naquilo que acha que é necessidade. A prioridade, meu filho, é acordar a cada dia, ver que está vivo e agradecer ao Pai Maior mais uma oportunidade de superar seus inúmeros defeitos de ser humano. Preto velho ama ocê como amava seus filhos encarnados, então, venho lhe pedir para escutar um pouco de minhas palavras. Aprenda a amar verdadeiramente sua religião, tenha verdadeira Fé na crença do Pai e seus orixás, nas Linhas da Umbanda. Em vez de ficar remoendo o que não acontece em sua vida, faça acontecer coisas boas para aqueles que sofrem muito mais e precisam de sua ajuda. Umbanda é Caridade acima de tudo, filho, mas também firmeza de querer, verdadeiro Amor à Espiritirualidade Bendita que luta tanto para que cada filho possa ter mais conforto nesta Terra Fria. Tenha mais humildade e mais reconhecimento em seu coração, entenda que é você quem constrói sua realidade, com a firme vontade que aquilo vai dar certo. Faça acontecer, filho meu, trabalhando em prol dos seus irmãos, e verá que tudo será mais fácil, os caminhos se abrirão, e o que é certo e bom para ocê acontecerá naturalmente sem qualquer exigência. Filho vai voltar agora para seu corpo físico, e com a ajuda de Oxalá, vai acordar com as palavras do velho no coração, para começar o dia buscando sua Felicidade.”

Realmente ao acordar, logo o rapaz sentiu-se diferente. Foi logo oferecer café para seu vôzinho espiritual, e acendeu uma vela agradecendo o bem estar que estava sentindo. Não mais aquela angústia em seu coração. Percebeu que todos os problemas pareciam menores e a mente mais clara para começar com motivação o novo dia. Tudo lhe pareceu possível, e lembrou envergonhado que havia ameaçado largar sua amada religião por algo agora percebia, dependia só dele se posicionar, vibrar positivamente e agir. Arrumou carinhosamente sua roupa branca dentro da mochila, para a sessão da noite, e saiu para o trabalho, disposto a ajudar e colaborar o mais possível com todos ao redor, pois tinha a sensação que só assim o seu coração iria ficar satisfeito, quando pleno de dádivas, bênçãos e Amor.

Preto Velho, lá de Aruanda enxugava os olhos marejados de lágrimas. Seu filho de banda não se lembrava do sonho, mas em sua alma repercutiam as lições da noite e as estava colocando em prática. Não era mais apenas um devoto pela metade, sem firmeza ou Fé verdadeira. Filho seu estava pronto para caminhar.

Alex de Oxóssi
Rio Bonito - RJ

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